Pulo do Lobo

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Ilações e elações

Eis que chega o dia da reflexão. Sobre os resultados, sobre os vencedores e sobre os vencidos.
Em primeiro lugar, o resultado. O dia de hoje é um dia histórico, por variadíssimas razões. A primeira das quais será Portugal ter elegido, pela primeira vez na sua história democrática, um Presidente não proveniente da área da esquerda. Não por uma questão de mero orgulho clubístico, mas porque hoje se inicia um novo ciclo político em Portugal. Com consequências visíveis, e de efeito crucial, no longo-prazo. Ao longo dos meses que antecederam a eleição, foi tentação fácil crer que a vitória estava perto e que era acessível. A noite eleitoral suada a que assistimos demonstrou o contrário: eleger um candidato contra o qual todos os outros se mobilizaram e contra o qual todos os argumentos, dos mais plausíveis aos mais rasteiros, foram esgrimidos, demonstrou ser uma tarefa hercúlea. Só agora nos é dado perceber o porquê da espartana campanha de Cavaco Silva, que não enstusiasmou pelos argumentos (ainda que tenha sido a única a apontar as linhas de rumo essenciais) e que não se recorreu daquilo que tantas vezes poderia ter feito, dizendo as coisas preto no branco. O planeamento estratégico da candidatura de Cavaco Silva foi arguciosa, e os dividendos chegaram na altura certa. De se lhe tirar o chapéu.
O grande vencedor da noite, sussurrou-me o senhor de la Palisse, foi ele mesmo, Cavaco Silva. Penso que o país escolheu um grande Presidente da República. Alguém que está sensibilizado para os grandes desafios que se avizinham. Alguém que tem uma posição descomplexada e pragmática quanto à posição que Portugal tem a ocupar no quadro internacional. Um político razoável e potencialmente catalisador das decisões políticas que teremos impreterivelmente de tomar. Mas também alguém dotado do bom-senso necessário para intervir construtivamente quando estas se afastarem daquilo que é o interesse nacional. Para além de todas as outras qualidades mencionáveis, há em Cavaco Silva uma pose de estado serena e discreta, como convém ao magistrado máximo da Nação.
Em relação aos vencidos, poucas palavras a proferir. Manuel Alegre é, tão somente, um putativo vencedor da noite. A retórica do movimento de cidadania, fora dos partidos, é, de todo em todo, uma tremenda inanição. Sobretudo se tivermos em conta o profundo oportunismo da coisa, em nenhuma medida atenuado pelo passado ultra-partidário do próprio. Com Alegre, a esquerda moderada não ficou apenas dividida - ficou desencorajada.
Mário Soares é, indubitavelmente, o grande derrotado da noite. Não tanto pela percentagem que os anais hão-de registar, mas mais pela autista, cega e arrogante caminhada que o conduziu a este resultado. O capital político de Soares, acumulado ao longo das décadas do Portugal democrático, não sofrerá danos de maior. Desaparecerá, porém, a aura mística do decano-mor da democracia, da qual a esquerda faz recorrentemente alarde exagerado. Soares é fixe e será fixe para todo o sempre. Um neologismo vago como epíteto não é o máximo que se pode ambicionar.
Para Louçã e para o Bloco, este foi o final de um ciclo. O partido é jovem e não descola do seu pendor volátil. O futuro é uma incógnita. Louçã mostrou-se um político com profundos conhecimentos na discussão das matérias fundamentais. No entanto, o seu modelo de discurso, entre o radicalismo beato e a moral de pacotilha, que tornou em grande parte possível o espantoso crescimento eleitoral do Bloco, está irrevogavelmente esgotado.
Jerónimo, o outro candidato apropriadamente apelidado de tribunício, sai reforçado e com ele o Partido Comunista. Desenganem-se aqueles que viam em Jerónimo o líder que afundaria, a prazo, o PCP. O prazo é bem maior do que possamos julgar. O PCP continua e continuará a ser opção. Mas há muito que deixou de ser solução.

Posto isto, resta-me rematar com um that's all folks, como diz a bonecada da televisão. Amanhã é um novo dia. O futuro a Portugal pertence.

P.S. - Mesmo para finalizar, uma palavra de inteiro reconhecimento ao Pedro Lomba, que teve a coragem e o discernimento de reunir esta equipa all star. Parabéns a ele, a todos e a cada um.

4 Comments:

  • At 7:13 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Houve nesta eleição 4 (Garcia Pereira não teve as mesmas oportunidades de todos os outros) contra 1. Quatro que tiveram sempre como objectivo comum e principal (e único) derrotar Cavaco Silva. Porquê? Segundo disseram porque eram de esquerda. E nunca se preocuparam com que nem nesse jargão velho se pudesse dizer, com seriedade, que ele fosse de direita. Não, eles eram de esquerda e isso nunca ele poderia dizer (e por isso nem podia, em Grândola, cantar o “Grândola”). Não, a eles bastava-lhes dizer que eram de esquerda. Isso os unia e os justificava enquanto candidatos.

    Houve esta noite uma grande vitória, que foi também uma “vitória esmagadora”. A diferença entre Cavaco Silva e Manuel Alegre, o 2º candidato mais votado, foi de, muito aproximadamente, 30% e 30% é, muito aproximadamente, uma vez e meia o número de votos de Manuel Alegre, ou seja, Cavaco ganhou à 1ª, teve cerca de duas vezes e meia mais votos do que o 2º candidato mais votado e a diferença entre eles é bastante (50%) maior do que o número de votos desse 2º.

    E todos o queriam (e só) derrotar a ele.

    E não foi por ser o mais bonito. Nem o melhor falante. Nem o mais desinibido. Não foi, bem o frisaram. Mas foi por ser o que é: COMPETENTE.

    É isto que faz a vitória esmagadora, porque por aí não poderiam eles ir (nem todos juntos). Não é essa a sua atitude. Não são esses os seus perfis (Soares ainda tentou, mentirosamente, insinuar que “ele o razoável economista de quem os meus amigos me disseram umas coisas acerca dos conselhos europeus” seria tão incompetente como eles…). Não é essa a sua preocupação. Quando, em função do estado do país, a competência se tornou o argumento decisivo, eles perderam qualquer hipótese de poderem vir a ganhar (à 1ª, à 2ª, à 3ª, …).

    E esta foi a 1ª vez que a competência foi a característica decisiva na eleição do Presidente da República. Não o poder falar-se muito, mas o saber-se como fazer.

    Competência é a atitude chave para Portugal. Não competitividade (de onde brotaria ela?), mas competência. Ao reconhecermos isto para o Presidente, que fiscaliza, modera, a partir de agora sugere e coopera e nos representa, temos de reconhecer isto para todos nós, nas nossas funções, nos nossos trabalhos. Em todos nós. E sempre em todos nós. Agora o exemplo virá de cima.

    (Somos o que fazemos com consistência; assim, a excelência não é um acto mas um hábito – ouvido a alguém que o terá ouvido a Aristóteles).

    Hoje Portugal trocou um “bando de tagarelas” por uma pessoa competente. Se cada um de nós adoptar para consigo esta preocupação, se o país entranhar esta atitude (não a palavra, mas a atitude), então, ainda não se tinham começado a contar os votos e já todos tínhamos ganho (todos menos os seguintes).

    Por muito sentido de estado que Cavaco tenha e diga que não, houve, com a sua vitória, uma derrota esmagadora (não tinha que ter havido quaisquer que fossem os números e as diferenças entre números). Houve pela atitude da esquerda.

    Essa esquerda, que enche a boca com essa palavra esquerda e que acha que por ser esquerda é justa, solidária, defende a liberdade e procura o desenvolvimento. Só por isso… só por ser esquerda. Como se tudo isso não fossem coisas que só se constróiem com muito trabalho, com muito esforço, muita dedicação e só se se tiver, também, competência.

    Quando Alegre e Soares têm como grande objectivo derrotar Cavaco Silva, quando é ele o grande adversário, quando sentem mais afinidades com Jerónimo e Louça (tudo porque são de esquerda), quando perdem assim, perde a esquerda (e a direita), essa coisa vazia cheia de palavras. E perde esmagadoramente porque não tinha sequer aquilo que a poderia fazer ganhar… não palavras, mas competência.

    Perdem porque, tal como Nietzsche, Portugal disse: “Oh! Como estou farto de toda esta insuficiência que se empenha em ser um acontecimento, seja como for!”.

    Escolheram ser assim e assim (finalmente) perderam. Agora tudo depende da vontade e da competência de cada um de nós.


    Vítor Paulo Vajão

     
  • At 2:08 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Desculpem-me, mas não posso deixar de reparar que não foram aqui referidos todos aqueles que votaram Cavaco Silva ontem, não porque acreditavam nele ou porque ele era o melhor, mas porque estavam "arrependidos" de ter votado PS em Fevereiro; por estarem igualmente "arrependidos" de terem "contribuído" para a eleição do actual governo; ou "apenas" porque ele seria o "único" a "travar" o governo; a "fazer-lhe frente"; etc, etc.
    A esses, apenas digo: marcamos encontro lá mais para a frente... (temos três anos e meio pra ver do que se arrependerão desta vez... afinal, há pessoas que se arrependem de tudo...)

     
  • At 9:04 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Ai o Ramalho Eanes era da área da esquerda? O que um gajo aprende aqui, pá!

     
  • At 5:04 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    If anything, I would think the Match Play tourney is more of a crapshoot than a stroke play event, so Tiger would have increased his chances of extending the streak by playing the Nissan. golf resorts But it's an insult to Byron Nelson and his record for the media and the PGA to continue to call Tiger Wood's streak a win streak. The injuries are what really, really hurt my year the most, says Daly, a winner of nearly $9 million on the Tour. And Daly's jovial attitude is back.

     

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